segunda-feira, 23 de maio de 2016

a batalha

engoli
o
sonífero
rivotril
20 mg
há quatro horas atrás
agora
as pálpebras
pesam
cinco toneladas
elas teimam
em se fechar
teimo em mantê-las
acesas
mas
quase nada vejo
escrevo nas trevas
como Ray Charles
tocava piano
com seus
olhos mortos
os meus
bicados por uma ave de rapina
estão extremamente feridos
gotas vermelhas
escorrem deles
e os
vermes espreitam
também não sei
o que escrevo
esse poema
sinto
devo
fazê-lo
custe o que custar
estou
com um cigarro aceso
próximo da morte
queimando os dedos
devo
fazê-lo
gosto de palavras
dançando na cabeça
e não as
guardo na gaveta
envio 
à página
como um direto
de um boxeador intrépido
gosto de assistir
lutas de boxe
elas me ensinam muito
sobre poesia
o golpe perfeito
o verso majestoso
um cruzado
um uper
nada de clinch
nada de encurvar-se
pensando
um fluxo de pancadas violentas
no papel
devo 
fazê-lo
é o atrito entre os ossos
que obriga o nascimento
dos versos
derramam veludo entre as vértebras
assim
cessa o rangido
esboço sorriso
deito a face sobre meu
próprio ombro amigo
com as
pálpebras teimosas
como cortinas de um palco
após o fim do espetáculo
com o
rivotril
essa droga
indutora de sono
a derrubo no último assalto
ela chora
indefesa
acariciando a lona
com suas lágrimas
devo
fazê-lo
fiz
e
ponto
final

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