quinta-feira, 5 de maio de 2016

está  morta a última prece

o poeta morreu
com ele
morreram
as viagens da borboleta azul
o cruzar de pernas das putas
mais carnívoras do
fim da noite
morreram
os sapos infestados pela dor da perda
os amigos que ele não mais tinha
as goteiras teimosas que somente
existiam para incomodá-lo
os leitores ávidos que somente
existiam para ignorá-lo
morreram
seus versos imbecis
sua caligrafia bêbada
sua poesia amargurada
tudo irá descer como um jato de vômito rumo
ao esgoto e aos ratos feridos
ao rio e aos peixes poluídos
enfim
ao oceano cinzento
de tanto ódio humano
morreram
as prostitutas baratas
que ele pagava tão bem
os mendigos apodrecidos
que ele enchia suas goelas de moedas
as amantes apetitosas
que na verdade ele já não tinha 
morreram
seus gestos de desespero solitário
seus passos de solidão desesperada
nas avenidas caladas
nas praças decadentes
em busca de algo
(ele não sabia o quê)
talvez uma busca  pelo prazer de
buscar
talvez como vaga-lume quisesse
brilhar
se unir
a outras tantas estrelas perdidas
compor
uma constelação
nem que fosse
um reunião
de estrelas tristes
assim
com ele
morreram
as últimas
preces
dedicadas a um povo
que
não
as
merece

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