sexta-feira, 15 de abril de 2016

a perseguição

seu olhar
crepuscular
morre pouco a pouco
quando passo
ao seu lado
enfeitiçado
a persigo
por entre pedras mortas
por entre pessoas mortas
por vitrines mortas
por esquinas mortas
tudo morto
( eu mesmo
do pescoço para baixo
morto )
mas o corpo
assim mesmo
se movimenta
obedece minha verdade
imagino um grande vento
levando meu corpo levado
ao seu
você
viva
ativa máquina feminina
em sussurro alto me chamando
abraço a longa avenida
abraço o último poste da longa avenida
a persigo
olho carnívoro
mira
enquadra
fotografa
a observa
(minha visão é microscópica)
vejo anéis hyppies em seus dedos
longos
finos 
ferozes
(minha visão é telescópica)
vejo os seus pelos
dos braços
das pernas
da nuca
eriçados
como torres cravadas na terra
e recobertas por teimoso cimento
ando
acelero 
espero
(você entra numa loja)
finjo estar à toa
(você sai)
com seu olhar
crepuscular
olho
você
não me vê
(como sempre   ninguém me vê)
você atravessa a avenida
eu atravesso
(quase morro
uma moto tenta me esquartejar)
ficaria bem na manchete do jornal:
"ANÔNIMO DESATENTO´É ATROPELADO NO CENTRO
SEM IDENTIFICAÇÃO   DESTINO   COVA RASA"
não!
ainda estou vivo
quero estrangular a solidão
não consigo
a persigo
rápido
como um raio entorpecido de vinho
ensaio um discurso
moça: "quero somente receber uma boa-tarde
suas palavras serão um golpe de carinho
nas faces isoladas (de tudo e de todos)"
talvez acrescente:
moça: "seus olhos são tão belos quanto um crepúsculo vermelho sangue"
não consigo 
ela se vai
como um filho que abandona o pai
mergulho as mãos nos bolsos
as fecho
com todo ódio
agarro
meu 
vazio
sorrio
parado na avenida
satisfação de quem ainda hoje
pode espancar a cabeça em algum
beco sem saída
  .

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